Não obstante o caput do artigo 5º da Constituição Federal traga em seu bojo a igualdade de todos perante a lei, infelizmente essa não é a realidade perpetrada pelos nossos Tribunais Superiores.

 

Diversas prerrogativas dos órgãos públicos como, por exemplo, o pagamento por meio de precatório, podem ser justificadas e entendidas, de fato, como prerrogativas porque o Estado Democrático de Direito está fundamentado, principalmente, na previsibilidade dos atos. Contudo, é necessária a devida inclusão do crédito no orçamento para que a população tenha pleno conhecimento da forma como está sendo empregado o seu dinheiro, sem, contudo, postergar indefinidamente o pagamento.

 

Todavia, infelizmente, algumas prerrogativas são verdadeiros privilégios, porque dificultam, desestimulam ou até mesmo impossibilitam, na prática, o pleno exercício do direito por parte do trabalhador que contribui, seja pela forma de pagamento de tributos, seja pela prestação de serviços.

 

Trataremos nesta oportunidade de apenas um deles, qual seja, a Orientação Jurisprudencial n.º 297 da SDI -1 do C. TST,[1] que veda a equiparação salarial entre servidores públicos independentemente de terem sido contratados pelo regime da CLT.

 

Há vedação da equiparação salarial prevista no artigo 461 da CLT quando se trata de empregados públicos, ou seja, entre empregados contratados no regime celetista para trabalhar em empresas públicas, sob o argumento de que o artigo 37, inciso XIII da Constituição Federal veda a equiparação de qualquer natureza para o efeito de remuneração do pessoal do serviço público.

 

Todavia, essa vedação em nada se assemelha à vedação do referido artigo 37, e isso porque, nas palavras de José Afonso da Silva, o que o inciso XIII do mencionado artigo veda é “a igualação jurídico formal de cargos ontologicamente desiguais, para efeito de lhes darem vencimentos idênticos…”,

 

Ademais, sea Constituição Federal vedasse a equiparação prevista no artigo 461 da CLT aos empregados públicos, não haveria, sequer, o reconhecimento do direito ao pagamento de diferenças salariais em casos em que se pleiteia desvio de função. Dessa forma, menos razão haveria para se negar a equiparação salarial àqueles que de fato desempenham exatamente as mesmas funções, sob pena de ofensa ao caput do artigo 5º da Constituição Federal, qual seja: “todos são iguais perante a lei”.

 

Como dizer que há igualdade onde há permissão para que dois empregados que desenvolvem exatamente a mesma função, na mesma localidade, para a mesma empregadora possuam remunerações diferentes?

 

A vedação da equiparação salarial entre duas pessoas que preenchem todos os requisitos previstos no artigo 461 da CLT só serve para consolidar a injustiça de se tratar de forma desigual os iguais e colocar os entes públicos acima de qualquer lei, deixando-os livres para tratar os seus empregados por uma lei própria, principalmente quanto à remuneração.

 

O que se vê é a aplicação de leis severas e intransigentes somente às empresas privadas, enquanto, que para os entes públicos, em nome das “prerrogativas”, referidas leis são maleáveis.

 

Independente de prestarem serviços a entes públicos, deve ser aplicado ao empregado público todas as normas previstas na CLT, sob pena da criação de um regime híbrido, vez que, embora possua todos os deveres do servidor público estatutário, não possui todos os direitos, além de não poder se valer de todos os institutos previstos na CLT.

 

A proibição da equiparação só se justifica quando se busca a equiparação entre servidor público celetista e servidor público estatutário, porque pertencem a regimes jurídicos diversos; contudo, essa distinção não pode ser admitida quando se trata de pessoas pertencentes ao mesmo regime jurídico de prestação de serviços, pois, como dito, a desigualdade entre iguais é vedada pelo artigo 5º da Lei Maior e também não pode ser avalizada pelo órgão máximo de representação de direito dos trabalhadores, pois se essa distinção é repudiada no âmbito privado também deve ser no âmbito público, sendo por isso imperiosa a reforma da Orientação Jurisprudencial n.º 297 da SDI -1 do C. TST.

 

Não se justificam tratamento tão diverso e nítida proteção oferecida ao ente público que, em verdade, deveria ser o primeiro a dar o exemplo de conduta escorreita.

 

O ente público deve, de fato, remunerar igualmente os seus colaboradores que desempenham a mesma função, na mesma localidade, para a mesma empregadora e com menos de dois anos de diferença de exercício na mesma função, nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho, porque a falta dessa obrigatoriedade e impossibilidade de se socorrer do Judiciário só contribuem para a perpetração da injustiça e do livre arbítrio do ente público.

 

Por fim, é de se atentar para o fato de que é a própria administração pública que permite a contratação por meio de aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho; portanto, deve também se ater às suas regras.

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[1] OJ 297 SDI-1 C. TST. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. SERVIDOR PÚBLICO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA, AUTÁRQUICA E FUNDACIONAL. ART. 37, XIII, DA CF/1988 (DJ 11.08.2003)

 

O art. 37, inciso XIII, da CF/1988, veda a equiparação de qualquer natureza para o efeito de remuneração do pessoal do serviço público, sendo juridicamente impossível a aplicação da norma infraconstitucional prevista no art. 461 da CLT quando se pleiteia equiparação salarial entre servidores públicos, independentemente de terem sido contratados pela CLT.

 

 

 

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