O “contrato de namoro” é o tema da vez. Nos últimos tempos, esse instrumento tornou-se famoso entre casais de namorados que desejam “regulamentar” o namoro diante do justo receio de que esta relação afetiva, até então informal, voluntária e sem a intenção de formar família, seja reconhecida como união estável, especialmente agora em que os requisitos para sua caracterização estão cada vez mais subjetivos.

 

Tudo porque, a união estável, por caracterizar-se uma situação de fato, foi reconhecida pela Constituição Federal como entidade familiar. Desde então tem recebido a proteção do Estado em vários aspectos, especialmente ao resguardar direitos previdenciários, além dos direitos de família e sucessão. E considerando sua natureza informal, o fato de não existir qualquer documento sobre essa união não quer dizer que ela não exista, pois ela pode ser provada de várias formas: contas correntes conjuntas, testemunhas, disposições testamentárias, apólice de seguro, entre outras hipóteses.

 

E inversamente à simplicidade de se demonstrar e provar a caracterização da união estável, está a dificuldade de se provar a ausência do chamado affectio maritalis, que é o ânimo de constituir família, característica primordial, estabelecida pela lei, para se reconhecer e caracterizar a união estável. É neste ponto que o “contrato de namoro” surgiria, para “registrar” que a relação existente entre as partes é de mero exercício voluntário do afeto, isto é, declarar, em suas disposições, a existência do relacionamento afetivo, estabelecendo os seus limites e destacando a ausência de ânimo marital.

 

Mas tornar objeto de contrato o simples exercício do afeto, informal e realizado apenas no exercício da autonomia das partes não parece ser a solução para a finalidade almejada, de proteção. Tanto que há acalorado debate jurídico sobre a validade e eficácia do tal “contrato de namoro”, que não parece garantir a desejada proteção do status de namoro, inclusive no que tange às questões patrimoniais das partes.

 

Isso porque, juridicamente, o “contrato de namoro” não possui qualquer embasamento legal, de modo que, além de não prover a segurança que dele se espera, tem sido duramente atacado pelo Judiciário por essas insubsistências.

 

Por mais que no âmbito do direito privado seja possível fazer tudo o que a lei não proíbe, o parágrafo único do art. 2.035 do Código Civil faz a ressalva de que nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública. Ou seja, uma vez presentes todos os requisitos legais que caracterizem a união estável, não seria possível, através do “contrato de namoro”, afastar o seu reconhecimento.

 

Em outras palavras, o “contrato de namoro” não seria válido, do ponto de vista jurídico, porque não é possível reconhecer validade a um contrato que pretende afastar o reconhecimento da união estável, cuja regulação é feita por normas cogentes, de ordem pública, indisponíveis pela simples vontade das partes.[1]

 

Nesse sentido, inclusive, foram os termos do v. Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo por ocasião do julgamento da apelação nº 1025481-13.2015.8.26.0554. Pelo referido julgamento decidiu-se pela improcedência da lide, pela qual as partes buscavam o reconhecimento e dissolução de “contrato de namoro”, pela ausência de previsão legal que reconheça esse tipo de contrato.

 

A decisão em comento veio a reforçar a invalidade do contrato de namoro, demonstrando ainda que, perante a justiça, esse tipo de instrumento não teria nenhuma utilidade para o fim almejado, descaracterizando a sua finalidade.

 

E mesmo que se admitisse uma possível validade do “contrato de namoro” suas disposições poderiam caracterizar fonte de enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento jurídica, porque mesmo depois da celebração do “contrato de namoro”, a relação pode evoluir para uma convivência duradoura, pública e continua, com o objetivo de formar família, além da aquisição de bens, onde uma das partes poderia adquirir bens em nome próprio, com o fim de afastar do outro a sua meação.

 

Deste modo entendemos não existir nenhuma razão para que seja celebrado contrato de namoro, em razão de sua impossibilidade jurídica e ineficácia diante do objetivo almejado.

 

Existindo o interesse do casal resguardar eventual direito patrimonial havido durante a relação afetiva, informal e voluntária do namoro, desde que inexista o ânimo marital, o ideal é que o casal busque o aconselhamento de um profissional de sua confiança para evitar futura litigiosidade e resguardar, cada um, o seu direito.

 

[1] GAGLIANO, Pablo Stolze. Contrato de namoro. 2006. Disponível em: . Acesso em: 14.dez.2018