Quando os laços sentimentais que uniam um casal se rompem e a vida em comum começa a tornar-se insustentável, insuportável, a separação surge como algo inevitável. Isso traz a debate diversas situações que envolvem o presente e o futuro, mudanças de ordem prática e jurídica, pois o que era feito pelos cônjuges ou companheiros em conjunto passará a ser suportado por apenas um deles. Dentre as preocupações que os afligem, surge a seguinte questão: o que acontecerá com os filhos comuns?

 

Não são raras as vezes em que somos procurados por pais aflitos que, além da preocupação com o enfrentamento jurídico do doloroso processo de divórcio, apresentam sinceras dúvidas e equivocadas concepções sobre a guarda dos filhos. Crenças como a de que “os filhos sempre ficam com a mãe” são as mais comuns e, por vezes, são capazes de frustrar as expectativas dos pais que procuram o Poder Judiciário para a solução desses conflitos.

 

Essas compreensões ainda são lembranças de uma ultrapassada cultura em que o pai, depois do divórcio, servia apenas de mantenedor financeiro da educação dos filhos, permanecendo como mero expectador de sua formação.

 

Hoje a realidade é outra. A evolução dos direitos fundamentais das pessoas alterou substancialmente a forma como a família e cada um de seus participantes é vista, sobretudo em relação aos menores de idade, que deixaram de ser vistos como objeto e passaram a ser protagonistas de direitos.

 

Por muito tempo, crianças e adolescentes foram vistos como algo pertencente aos genitores, incapazes de expressar vontade e sentimento, tanto que se discutia apenas sobre como proteger aqueles que estavam em situação de risco. Somente com a redemocratização do Brasil, na década de 1980, surgiu o movimento que rompeu com a antiga concepção sobre a infância e juventude, elevando crianças e jovens ao status de sujeitos de direitos capazes de expressar suas vontades.

 

A partir dessas transformações do direito, materializadas em capítulo próprio da Constituição Federal e regulamentadas no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil, as convicções que outrora reinavam na mentalidade dos casais, hoje não mais condizem com os reais direitos de pais e filhos. Em razão disso, reunimos a seguir alguns dos questionamentos mais frequentes sobre as modificações no direito de guarda, de visitas e de prestação de alimentos dos filhos menores que tem inquietado os casais que se separam, a fim de esclarecer as dúvidas sobre esses pontos.

 

De quem é a guarda dos filhos comuns?

 

Desde a promulgação da Lei nº 13.058, em 2014, o Código Civil Brasileiro passou a estabelecer, no art. 1.584 que, via de regra, a guarda dos filhos será compartilhada. Isso significa que, salvo raríssimas exceções, ambos os pais são responsáveis pela criação dos filhos comuns, exercendo conjuntamente os direitos e deveres de pai e mãe, ainda que não convivam sob o mesmo teto.

 

Essa regra surgiu com a finalidade de garantir à criança o direito de conviver igualmente com ambos os pais, direito esse que não era contemplado por meio de meras visitas daquele genitor que não tivesse a guarda. Com isso, o direito de guarda dos filhos passou a ser de ambos os genitores, que compartilharão todos os bônus e ônus decorrentes da formação dos filhos.

 

Por ser recente, o regime da guarda compartilhada ainda gera uma série de dúvidas sobre a sua prática. Mas a experiência tem demonstrado que o seu emprego é o que melhor atende os anseios dos filhos, pois permite a ambos os pais compartilharem de seu cotidiano, participando ativamente das decisões sobre a sua formação pessoal, tais como a escolha da escola e de cursos extracurriculares e, principalmente, a sua formação moral e de caráter.

 

Outro ponto positivo da guarda compartilhada é que sua instituição tem repelido situações em que as crianças eram tratadas como “troféu” daquele que “ganha” a guarda ao final do relacionamento. Isso evita que os filhos se sintam excluídos do núcleo familiar paterno ou materno, proporcionando que eles desfrutem do afeto e cuidado de ambos os genitores, mantendo vivo todos os laços familiares e fraternos.

 

A guarda sempre será compartilhada? Existe exceção?

 

Embora a regra seja o exercício da guarda compartilhada, a realidade familiar pode impedir que ela seja estabelecida. Assim, em circunstâncias onde ficar demonstrado que essa divisão de responsabilidades não atende o melhor interesse dos filhos, o juiz poderá estabelecer a guarda de maneira diversa, inclusive unilateral, isto é, exclusiva a um dos genitores.

 

De um modo geral, as exceções previstas na legislação para estabelecer a guarda unilateral são: (i) quando um dos pais não possuir capacidade para criar os próprios filhos, por serem ébrios, dependentes químicos e/ou violentos, ou (ii) quando ficar comprovado que os pais não mantiveram uma relação respeitável e harmoniosa durante o regime de guarda compartilhada, gerando um ambiente inconveniente ao desenvolvimento sadio dos filhos.

 

Nesse último caso, para definir com quem ficará a guarda, serão avaliadas as condições que atenderão ao melhor interesse dos filhos, considerando-se tanto a capacidade patrimonial de cada um dos pais como também o cotidiano das crianças, as afinidades com um ou outro genitor e demais familiares, proximidade com escola, clube, cursos, etc., sempre procurando manter a antiga rotina dos filhos, evitando, assim, o sentimento de que eles estariam sendo castigados pelo desentendimento dos pais.

 

Com a guarda compartilhada, os filhos terão duas residências?

 

Estabelecer a guarda compartilhada não significa dizer que os pais deverão manter duas residências para os filhos. A divisão da guarda significa a divisão das responsabilidades na educação e no desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social dos filhos. Nesse ponto, é importante lembrar que, mesmo com eventual guarda unilateral, o genitor que não detiver a guarda dos filhos terá o dever de supervisionar se o outro está atendendo aos interesses das crianças, podendo requerer que lhe sejam prestadas informações, inclusive prestação de contas em assuntos e/ou situações que afetem a educação e a saúde dos filhos.

 

A guarda compartilhada também não exige divisão igualitária do tempo de convivência dos filhos com os responsáveis, mas sim que este seja estabelecido de modo a alterar, o mínimo possível, a rotina que os filhos possuíam antes da separação dos pais.

 

A lei não estabelece regras quanto a residência dos filhos, permitindo que seja fixada do modo que for mais conveniente às expectativas deles e dos pais. A residência poderá ser estabelecida com apenas um dos genitores, acordando-se um regime de convivência mais flexível com aquele que não residir com os filhos, como também pode ser estabelecida com ambos os pais, com períodos pré-estabelecidos para cada casa.

 

E caso a realidade permita, pode-se, também, definir uma residência única para os filhos, alternando-se a permanência dos genitores na casa, lembrando-se sempre que a residência deverá ser estabelecida privilegiando o melhor interesse dos filhos.

 

Estabelecida a guarda compartilhada, extingue-se o dever de pagar alimentos?

 

A guarda compartilhada não altera o dever de prestar alimentos, pois ela não anula a necessidade dos filhos com relação a alimentação, educação, saúde e lazer. O custeio das necessidades deles é obrigação de ambos os pais, que contribuirão de acordo com a sua possibilidade.

 

Por certo, a divisão das obrigações com a educação e o desenvolvimento dos filhos pode acabar alterando certas necessidades, de modo que a prestação de alimentos em dinheiro deverá ser analisada caso a caso, observando-se as despesas para a manutenção de seu padrão de vida e a possibilidade de cada genitor para quantificar o pagamento de alimentos.

 

Portanto, eventuais alimentos serão estabelecidos dentro dos critérios de necessidade e possibilidade diante da realidade de cada família, tudo com o objetivo de proteger o melhor interesse dos filhos e manter, na medida do possível, o mesmo padrão de vida que tinham durante a união dos pais.

 

Conclusão

 

Como se pode ver, as últimas modificações legislativas materializaram a nova posição das crianças e adolescentes na sociedade. Agora, como sujeitos de direito, eles possuem a garantia de que seus interesses serão defendidos, inclusive pela atuação do Ministério Público.

 

É importante que os pais estejam preparados para essa nova realidade, buscando manter, sempre que possível, um nível de urbanidade entre si após a separação, objetivando privilegiar os interesses de seus filhos. Como cada situação será tratada como única é imprescindível que os pais, nessas situações, busquem o auxílio de um profissional especializado na área de família, para receber orientações específicas para o seu caso.